quarta-feira, 15 de março de 2023

Louise Glück: Lamium

 


    No poema a seguir, Louise Glück (1943-) emprega elementos da natureza como metáforas para a iluminação espiritual: o eu lírico, qual um lamium, germina em lugares sombrios, prescindindo de luz alheia e dispensando o calor do sol.
   Sua voz parece dirigir-se a alguém que se consagra à busca de uma verdade particular, aparentemente ignota a nós. “Os seres vivos”, porém, “não requerem / luz na mesma intensidade.” Talvez esse alguém, encontrando enfim a verdade procurada, retire-se e viva como o eu lírico, em sombras, amando “tudo o que é frio”.


LAMIUM

This is how you live when you have a cold heart.
As I do: in shadows, trailing over cool rock,
under the great maple trees.

The sun hardly touches me.
Sometimes I see it in early spring, rising very far away.
Then leaves grow over it, completely hiding it. I feel it
glinting through the leaves, erratic,
like someone hitting the side of a glass with a metal spoon.

Living things don’t all require
light in the same degree. Some of us
make our own light: a silver leaf
like a path no one can use, a shallow
lake of silver in the darkness under the great maples.

But you know this already.
You and the others who think
you live for truth and, by extension, love
all that is cold.



LAMIUM

É assim que vives quando tens um coração frio.
Como eu: nas sombras, rastejando sobre pedras frias,
sob os grandes carvalhos.

O sol quase não me toca.
Às vezes vejo-o no começo da primavera, nascendo bem distante.
Então folhas crescem sobre ele, escondem-no por completo. Sinto-o
brilhar entre as folhas, errático,
como se alguém tocasse um copo de vidro com uma colher de metal.

Os seres vivos não requerem
luz na mesma intensidade. Alguns de nós
fazemos nossa própria luz: uma folha de prata
como um caminho que ninguém pode usar, um lago
raso de prata na escuridão sob os grandes carvalhos.

Mas já sabes disso.
Tu e outros que pensam
que vivem pela verdade e, por extensão, 
amam tudo o que é frio.


(Glück, Louise. Poems 1962-2012
New York: Farrar, Straus and Giroux, pág. 249)

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