A poesia de Paul Celan (1920-1970) costuma resistir a interpretações mais imediatas: hermético, Celan tece poemas fechados em si, autorreferentes e, por vezes, quase ininteligíveis. Auxilia-nos a leitura de sua obra saber que, entre traumas, transtornos e crises pessoais, o poeta renunciou à própria vida afogando-se no Sena, em Paris.
Nos curtos versos a seguir, Celan ressalta o sentido da luz e da escuridão como forças que se alimentam. Diante dos tormentos da existência humana, o lume da pessoa amada gera uma sombra que nos dá corpo; é de escuro em escuro que nos emerge a possibilidade de travessia e iluminação.
DE ESCURIDÃO EM ESCURIDÃO
Abriste os olhos – vejo minha escuridão viver.
Eu a vejo até o fundo:
mesmo aí ela é minha e vive.
Leva isso além? E desperta ao levar?
De quem a luz que me acompanha o pé
e um barqueiro para si encontra?