Muitas vezes, Tomas Tranströmer (1931-2015) pode parecer-nos um poeta alienado. Trata-se, contudo, de uma impressão equivocada: seus versos consistem em tranquilas afirmações com poucas palavras, mas também numa forma implícita de resistência ao poder e à apatia dos tempos modernos. O poema a seguir, de 1962, revela-nos a particular habilidade de extrair grandeza das cenas simples e cotidianas, simultaneamente atuando como um tributo à música, arte amada por Tranströmer, e como uma maneira de mostrar-nos que, até durante os períodos escuros da vida, conseguimos encontrar alento, calma e o sentimento de liberdade.
Eu toco Haydn após um dia negro
e sinto um calor tranquilo nas mãos.
As notas se dispõem. Marteladas gentis.
Os ecos são verdes, vivos e calmos.
A música diz que a liberdade existe
e alguém não paga as taxas do imperador.
Enfio as mãos nos meus Haydn-bolsos
e imito uma pessoa serena sobre o mundo.
Alço a Haydn-bandeira – a mensagem é:
“Não nos rendemos. Mas queremos paz”.
A música é uma casa de vidro no declive
aonde as pedras voam, as pedras rolam.
E as pedras rolam direto para dentro da casa,
porém cada vidraça permanece intacta.
––
ALLEGRO
I play Haydn after a black day
and feel a simple warmth in my hands.
The keys are willing. Soft hammers strike.
The resonance green, lively and calm.
The music says freedom exists
and someone doesn’t pay the emperor tax.
I push down my hands in my Haydnpockets
and imitate a person looking on the world calmly.
I hoist the Haydnflag – it signifies:
“We don’t give in. But want peace.”
The music is a glass-house on the slope
where the stones fly, the stones roll.
And the stones roll right through
but each pane stays whole.
(TRANSTRÖMER, Tomas. The Great Enigma: New Collected Poems.
Traduzido por FULTON, Robin. Bloodaxe Books, 2006, pág. 96).
Lindo e leve!
ResponderExcluirMuito bom! Quero mais
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