terça-feira, 30 de abril de 2024

Mahmoud Darwish: Palestina



    Embora possa parecer ínfera, uma das maneiras de ampliarmos nossa consciência do corrente morticínio perpetrado por Israel contra crianças, mulheres e homens em Gaza consiste em apreciar as boas coisas que a Palestina deu ao mundo. E uma dessas coisas é a belíssima poesia de Mahmoud Darwish (1941-2008).
    Quando tinha seis anos, Darwish viu sua vila natal, Al-Birwa, ser ocupada e destruída pelos israelenses. Desde então, passou a viver em condições errantes até morrer nos distantes Estados Unidos, e seus versos tornaram-se tanto a nostálgica expressão de uma alma sensível como a voz dos sofrimentos, alegrias e singularidades de uma terra e de um povo.
       A seguir, seu breve poema Nesta Terra, que traduzo da antologia em inglês Unfortunately, It Was Paradise (p. 6).


Nesta Terra

Nesta terra, temos o que faz a vida valer a pena: a hesitação de abril, o bom cheiro de um pão ao amanhecer, as opiniões de uma mulher a respeito dos homens, a poesia de Ésquilo, o começo do amor, a grama brotando das pedras, mães caminhando sobre fios de flauta, o medo que a memória causa no invasor.

Nesta terra, temos o que faz a vida valer a pena: os dias finais de setembro, uma mulher que entra nos quarenta com vigor, o momento em que o sol brilha na prisão, nuvens imitando animais, o aplauso para aqueles que encaram a morte sorrindo, o medo que a música causa no tirano.

Nesta terra, temos o que faz a vida valer a pena: nesta terra, a Senhora da Terra, mãe de todos os começos e fins. Ela se chamava Palestina. E ainda se chama Palestina. Minha Senhora, pois tu és minha Senhora, eu mereço viver.


On This Earth

We have on this earth what makes life worth living: April's hesitation, the aroma of bread at dawn, a woman's point of view about men, the works of Aeschylus, the beginning of love, grass on a stone, mothers living on a flute's sigh and the invaders' fear of memories.

We have on this earth what makes life worth living: the final days of September, a woman keeping her apricots ripe after forty, the hour of sunlight in prison, a cloud reflecting a swarm of creatures, the peoples' applause for those who face death with a smile, a tyrant's fear of songs.

We have on this earth what makes life worth living: on this earth, the Lady of Earth, mother of all beginnings and ends. She was called Palestine. Her name later became Palestine. My Lady, because you are my Lady, I deserve life.

            (tradução de Munir Akash e Carolyn Forché)

Miguel de Unamuno: Minha Religião

  Demonstrando, mais uma vez, sua famosa irreverência intelectual, Miguel de Unamuno (1864-1936) expõe, num pequeno ensaio intitulado Mi Rel...